Posted by António J M Silva

A arte cinematográfica (e a teatral) contemporânea tende cada vez mais a aglutinar, na sua expressão, categorias tecnológicas radicadas nos meios digitais em evolução. Não se trata somente de englobar técnicas já enraizadas, na produção e realização de um filme como, por exemplo, os “efeitos especiais”, mas antes, assimilando a própria complexidade do meio digital. No início deste século a trilogia de filmes Matrix tentou abordar cinematograficamente, as diferentes peças constituintes daquele meio integrando real com virtual. Recentemente, em filmes como Interstellar e Inception ( “A origem”) a existência de diferentes níveis de interação, espaço-tempo no primeiro e de sonho-acordado no segundo, aprofundam esta tendência, a meu ver. Em particular este último ( passou no canal Hollywood há pouco tempo )  utiliza as ferramentas  do hardware e software, acoplando sono-sonho de um modo multissensorial, pois engloba imagens, som e efeitos especiais diversos. O protagonista do filme – Dom – tem capacidades mentais que lhe permitem partilhar sonhos com outras personagens e, deste modo modelar os diferentes níveis ( camadas? ) do sonho. Dom está acusado injustamente, pela morte da sua mulher (de nome Mal) e não pode ver os filhos. Utilizando uma máquina ( que nunca se percebe exactamente o que é… mas que será um hardware ?-computador?) consegue aceder ao consciente e subconsciente de alguém e viajar em conjunto pelos seus sonhos. Dom é contratado por Saito, um empresário japonês, que quer modificar a mente de R. Fischer, filho de um concorrente nos seus negócios. O objectivo é consegui-lo através da partilha de sonhos e implantação (inception) no sub-consciente de R.Fischer , de uma ideia ( decisão): não seguir determinada via empresarial que colida com a de Saito. Este, oferece a Dom uma recompensa: poder estar com os filhos livremente, na vida real. Dom aceita e, após reunir uma equipa de especialistas, aproxima-se de R Fischer, num voo que transporta a urna do pai deste ( falecido) e, em simultâneoi, permitirá o regresso daquele à sua casa e aos filhos. Durante o voo, toda a equipa entra no sub-consciente de R Fischer, com a ajuda da máquina, dividindo o trabalho em vários patamares de intervenção, de modo a confrontar e ultrapassar as defesas que o empresário interiorizou na sua mente. Estas defesas ( homens ao serviço de R Fischer) representam  cenas referenciadoras de outros prévios filmes de acção (base de dados) com lutas e  batalhas que decorrem em diferentes níveis do sonho dos diversos intervenientes, e  que vão sendo manipulados pela equipa numa relação temporal distinta: há cenas que são mais rápidas a resolver e outras mais lentas, dependendo da profundidade onírica.  Entretanto, Mal, que existe somente na mente de Dom e que já se intrometera noutras tarefas deste, assume um papel de oposição e obriga ao aprofundamento do sonho até uma camada onde a incerteza é grande – o limbo. Aquela virá a ser “morta” , com a anuência de Dom. Depois de várias peripécias , em que o desmoronamento do sonho vai acontecendo com recurso a efeitos especiais combinando vídeos de edifícios a ruir, com personagens a levitar em meio agravitacional   e duração assíncrona do tempo, o objectivo ( inception) é conseguido e todos os intervenientes acordam. Um pequeno Totem, (no casode Dom é uma piasca circular) que todos possuem, confirma o seu regresso ao mundo real. Dom re-encontra então a casa e os filhos, finalmente. O filme permite perceber um mundo hiper-real mas que é virtual, sendo que a recompensa é o retorno a uma realidade familiar, estruturada.